Gémea do Sol ajuda a compreender o ciclo solar e o seu efeito no clima da Terra
Imagem do Sol na banda do visível, colorida artificialmente, obtido pelo Solar Dynamics Observatory (SDO) durante o último máximo do seu ciclo de 11 anos. Além das manchas solares pode ver-se, em especial na orla do Sol, zonas mais claras denominadas fáculas. Crédito: SDO/NASA
Uma equipa internacional, que inclui vários investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), usou observações do telescópio espacial Kepler (NASA) e outros telescópios à superfície da Terra, para observar a estrela análoga ao Sol HD 173701. As observações apontam para que a diferença do ciclo de atividade entre esta estrela e o Sol é devida à diferença da metalicidade das duas estrelas.
Para Tiago Campante (IA e Faculdade de Ciências da Universidade do Porto): “Do mesmo modo que estudos envolvendo irmãos, ou até gémeos, têm um papel importante no campo da psicologia do desenvolvimento, estudos de estrelas análogas ao Sol permitem aos astrofísicos enquadrá-lo do ponto de vista evolutivo e da sua estrutura interna. O presente estudo da variabilidade de uma estrela análoga ao Sol vai permitir-nos melhor compreender os mecanismos físicos subjacentes ao próprio ciclo solar. Este tipo de conhecimento é extremamente valioso e pode, por exemplo, ajudar-nos a perceber de que forma o Sol afeta o clima no nosso planeta”.
A observação de manchas à superfície do Sol permitiu determinar que o Sol tem uma variabilidade na sua atividade magnética com um período de cerca de 11 anos – o ciclo solar. Este ciclo é regido pelo dínamo solar, que resulta da interação entre os campos magnéticos, a convecção e a rotação diferencial do Sol. No entanto, a física por detrás do dínamo solar ainda não é totalmente conhecida.
Para a ex-aluna de doutoramento do IA e da FCUP, Ângela Santos: “Estudar outras estrelas, especialmente aquelas que são semelhantes ao Sol, ajuda-nos a conhecer e a compreender melhor a nossa própria estrela”.
A estrela HD 173701 é uma dessas estrelas. A equipa analisou observações desta estrela, que vão desde 1978 até às mais recentes, obtidas com o telescópio espacial Kepler, para determinar que o seu ciclo é de 7,4 anos. As observações, que envolveram uma combinação de fotometria, espectroscopia e asterossismologia, determinaram que a amplitude do ciclo desta estrela é mais do dobro que a do Sol.
Sendo a única diferença entre as duas estrelas a metalicidade, com a HD 173701 a apresentar quase o dobro dos “metais” que tem o Sol, parece indicar que a metalicidade é um fator importante na variabilidade das estrelas.
Santos, atualmente a trabalhar no Space Science Institute (SSI) em Boulder (E.U.A.), acrescenta ainda: “Através de estudos como este, que envolveu diferentes tipos de observações, componentes e técnicas, podemos obter informações detalhadas sobre as propriedades das estrelas, incluindo propriedades magnéticas. E assim compreender melhor os processos físicos que dão origem aos ciclos de atividade magnética.”
Com base em modelos físicos, a equipa adianta uma explicação com duas componentes para a diferença de comportamento entre o Sol e a HD 173701. Em primeiro lugar, os elementos mais pesados fazem com que a estrela fique mais opaca e o transporte de energia no interior da estrela muda de radiativo para convectivo, que é mais eficiente. Isto torna o dínamo mais potente, o que influencia a amplitude da variabilidade e a rotação da estrela. Em segundo lugar, esse elementos influenciam os processos que ocorrem à superfície e na atmosfera da estrela, em particular, aumentam o contraste entre as regiões mais brilhantes (denominadas fáculas) e o resto do Sol, que por sua vez aumenta a variabilidade da estrela.
Este estudo estabelece novos limites e fornece novas pistas para compreender como a irradiância solar irá evoluir com o tempo, e como isso irá afetar o clima na Terra. Há exemplos históricos de como a atividade solar afeta o clima, com é o caso do chamado mínimo de Maunder, um período de cerca de 50 anos de atividade solar mais fraca que o normal, que começou no final do séc. XVII, e que coincidiu com uma “mini época glaciar”, em especial na Europa.